Acordei bem cedo, na verdade eu quase não dormi de tanta ansiedade, devo ter dormido no máximo duas horas. Levantei com a ansiedade caminhando do meu lado igual um encosto, eu conseguia sentir ela começando a se materializar na minha frente. Mas, ignorei e segui com a rotina da manhã: tomar banho, escovar os dentes, me arrumar e ir pro trabalho. Aliás, o motivo de tanta ansiedade foi meu novo trabalho. Cheguei na escola fingindo costume, dei bom dia, cumprimentei todas as pessoas que vi e fui tratada com muita gentileza, mas sentia como se a qualquer momento alguma coisa fosse dar errado.
Ao entrar na sala de aula, coloquei a bolsa na mesa e meu olhar se cruzou com o de algumas crianças que me observavam, também, com gentileza e alguns sorrisos tímidos. Quando olharam para a frente e me viram em pé, os olhares curiosos se voltaram para mim como se eu fosse dar uma grande notícia, detivesse todo o conhecimento do mundo ou algo assim. Eu iniciei sorrindo, tentando passar confiança e, por um breve momento, senti a tensão deixando meu corpo. Eu me preparei para isso, os olhos estavam voltados para mim. Estava silêncio. Era o meu momento. Abri a boca e senti as palavras saindo: "Boa tarde, turma! Meu nome é…" e antes de terminar a frase, alguém bateu na porta.
Era um professor que pediu licença e me apresentou duas alunas que sorriram para mim, ele conversou um pouco comigo, explicou que lecionava uma disciplina de estágio obrigatório e se eu poderia recebê-las. Fiz que sim, mas não sei se tinha muita opção. Por dentro estava entrando em colapso, já sentia a tensão tomando conta do meu corpo novamente.
Na minha cabeça só conseguia pensar: logo agora?
As meninas se dirigiram até as cadeiras vazias para observar e tentei retomar a fala, mas a minha voz não estava mais confiante, as crianças já tinham se dispersado, uma berrava, outra contava uma história para mais duas, alguns jogavam aviõezinhos de papel. Estava um caos. Aqueles 5 minutos que o professor me interrompeu parecia ter aberto uma cratera no espaço-tempo e as crianças tinham tomado conta da sala. Era o governo delas!
Tentei pedir silêncio, mas acredito que eles nem me ouviram por causa do barulho simultâneo que todas faziam. Pedi silêncio uma, duas, três, CINCO vezes, mas o barulho e a bagunça não cessavam. Até que me senti gradativamente saindo do controle e gritei com elas. Alto. E briguei por causa da bagunça. Mais alto ainda. A sala ficou muda, era o que eu queria, mas no mesmo momento senti a culpa me consumindo. Fiquei em silêncio junto com eles por alguns segundos, pensando em como recalcular a rota, desejando que aquele grito fosse apagado.
As crianças me encaravam, agora, meio tímidas e com um pouco de receio de receberem outro grito. As estagiárias pareciam constrangidas também. Eu me sentia sendo julgada até pelas paredes. Tentei seguir com o conteúdo programado para aquele dia, mas tudo parecia forçado, eu só queria sumir dali. Estava tão confusa e desnorteada que esqueci até de falar meu nome para as crianças. Só lembrei mais tarde quando uma delas me perguntou.
O sinal do intervalo ressoou. Estridente. Não tive nem coragem de sair da sala, fiquei ali mesmo sendo consumida pela culpa e tentando me confortar que era só o primeiro dia e que às vezes as coisas dão errado mesmo e que embora eu esteja ali como professora, ensinar é também aprender. Espero encontrar meu ritmo nos próximos dias e que a primeira impressão, pelo menos dessa vez, não seja a que fique; que as estagiárias possam me conhecer e descobrir que assim como elas aquele também era meu primeiro dia e eu estava tão nervosa quanto elas.
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