Eu havia jurado a mim mesmo que jamais assumiria outro cargo de gestão. As últimas vezes tinham terminado em depressão, leve ou severa. Mas as coisas ficaram animadas com o Projeto Pajeú, outras professoras se envolveram e, sem entrar em detalhes, que são muitos, acabei assumindo a diretoria da escola. A depressão está rondando, sinto seu cheiro por perto, e não sei quanto tempo mais conseguirei aguentar, mas hoje foi um daqueles dias que vale a pena, literalmente: vale o sofrimento, vale a aflição, vale o tormento.
Durante a manhã e a tarde, tivemos atividades de inauguração da expansão da escola para a área do terreno vizinho, que estava abandonado há muitos anos. Com o impacto midiático do Projeto Pajeú e o trabalho insistente da Associação de Pais, Mães e Amiga(o)s da Escola Alba Frota, conseguimos convencer a prefeitura e outras instituições de apoio a ceder o terreno e construir os novos espaços pedagógicos da escola.
Fonte: Google Earth |
As crianças vibraram com a pequena quadra coberta. Adultos responsáveis amaram os novos espaços e pessoas de acolhimento (agora as crianças atípicas, além de estarem nas salas de aula, também têm atendimento individualizado diário). Professora(e)s adoraram a nova sala de planejamento e descanso (sim, temos redes!). Estagiária(o)s vibraram ao ver uma sala só dela(e)s, com material garantido para as suas mais mirabolantes ideias pedagógicas.
Meu espaço favorito é um círculo de bancos ao redor de uma árvore. Um pequeno jardim aconchegante onde realizaremos os encontros das PA (Professoras Anônimas). É uma ideia antiga minha de que professora(e)s, assim como alcoólatras e narcóticos, precisam de um espaço-tempo para compartilhar suas dores, seus desafios, suas vitórias. A ideia começou a tomar forma no Projeto Pajeú, que se estendeu para além da Alba Frota. Criamos uma rede de escolas próximas ao percurso do riacho. Cada escola estudou a fundo o Pajeú próximo de si, as construções, os impedimentos ao fluxo do rio. E, na medida em que o projeto avançava, as pessoas de cada escola passavam a cuidar de seu trecho do Pajeú, que começou a sair debaixo da terra e se sentir vivo.
Nos dias de planejamento, havia encontros das professoras de cada escola. Professoras da Alba Frota iam planejar em outras escolas e professoras de outras escolas vinham para a Alba Frota. Além do projeto em si, começaram a falar de outros assuntos, outros maus cheiros, outros "rios" poluídos que impactavam sua prática pedagógica. Fazia bem desabafar. Mas queríamos ir além. Negociamos com a Secretaria Municipal de Educação para que as formações pedagógicas das escolas da Rede Pajeú fossem feitas in loco, nas próprias escolas, e que constassem menos de palestras de pessoas que não conheciam os desafios do dia a dia e mais de diálogos emancipatórios na busca de resolver os dramas cotidianos.
O sol vai se pondo, todas as pessoas já se foram, mas eu quis ficar aqui um pouco mais, em silêncio, num dos bancos debaixo da árvore das PA. "Quem canta seus males espanta". Quando escrevo, espanto também o mau cheiro da Senhora Depressão, que não me pega mais tão fácil. Acho que já está na hora de voltar pra casa e descansar. Hoje foi um dia de inauguração. A partir de amanhã, vejamos como o rio flui num dia comum.
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