"Em todos esses anos nessa indústria vital, é a primeira vez que isso me acontece." Pica Pau
A primeira quarta de Agosto. Minha primeira aula como professora, oficialmente. Quando entrei na sala, segurando o plano de um lado e uma garrafa de água no outro, lembrei da frase que um familiar me disse com certa decepção quando anunciei que tinha passado pra Pedagogia: "Tu vai ser professora, Loriene?". É… professora. Agora eu sou uma professora. E eu sei o quanto este ofício pode ser chamado de nobre.
Pois bem, aula de língua portuguesa, minha matéria favorita. Cheguei, cumprimentei a turma, contei como seria nossa primeira aula e tomei um susto. Pois no fundo da sala, numa cadeira do canto, estava, ninguém mais ninguém menos, do que a Loriene de 9 anos. Ela me olhava com os olhos arregalados, com uma cara que dizia "A gente não ia ser cartunista?" e eu a encarei de volta, como se dissesse "Calma, eu posso explicar". Seu cabelo estava bagunçado e eu entendi porque minha irmã mais velha dizia que eu parecia a Hermione Granger nos primeiros filmes.
Como eu não podia ficar de conversinha com a minha eu do passado naquela hora, continuei a aula como se nada estivesse acontecendo. Eu tinha levado várias tirinhas cortadas para as crianças escolherem e lerem à vontade. Dos recortes que eu levei, podia-se encontrar tirinhas da Mafalda, de Calvin e Haroldo, de Hagar, o horrível, da Turma da Mônica e do Ziraldo. A Loriene de 9 anos gostou muito daquilo, porque é algo que ela ama fazer com os livros didáticos que tem em casa. Ela curtiu e eu curti que ela curtiu também. Enfim, a gente curtiu. E, graças a Deus, não só ela, mas as outras crianças também gostaram bastante. Depois do momento de leitura, cada um foi convidado a produzir sua própria tirinha da maneira que quisesse, a única regra é que eles deveriam ser um dos personagens. Depois, faríamos um cartaz com todas as nossas tirinhas expostas para apreciação, tanto dos colegas da turma, quanto das outras crianças da escola. Nesse meio tempo, eu me aproximei da mini Lori e ela me perguntou baixinho:
- Quando foi que a gente quis ser professora?
- Vixe, só lá pros 18. - respondi.
- Mas a gente não fala muito baixo?
- A gente vai aprender a falar alto quando for preciso. Olha, não se preocupe, a gente ainda vai querer fazer muita coisa antes de querer ensinar, mas, sinceramente, eu acho que Deus quer que a gente seja professora. Então se ele quiser, a gente vai dar conta. Ok?
Hum, tá bom. Eu já vou, vai começar o Pica Pau.
E assim, a Loriene criança se foi. Na verdade, acho que ela sempre vai me acompanhar nessa jornada de docência, porque, por mais que ela nunca tenha desejado ser professora, ela vai me lembrar do que eu preciso para ser uma das boas, assim espero. Ela vai me lembrar que um dia eu fui criança e que a infância é preciosa. Ela vai me lembrar de ter paciência comigo e com os outros. A gente perde muito quando se esquece dessa nossa versão pequenininha. Que sejamos gentis com a criança que a gente foi e que ainda guardamos dentro da gente.
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