Na véspera das férias escolares, meu irmão recebeu um comunicado da escola Alba Frota convidando os responsáveis para uma reunião e entrega do boletim das crianças. Meu irmão e sua esposa não iriam conseguir ir para a reunião devido seu trabalho, porém como tio e alguém que acompanha o desenvolvimento da minha sobrinha, decidi participar. A reunião aconteceria no turno da tarde e naquele dia, levei minha sobrinha para escola e permaneci enquanto aguardava a reunião.
Logo ao chegar percebi um movimento diferente, uma alegria muito grande por parte das professoras, cheguei até presenciar uma brincadeira entre duas professoras: — Hoje é o último dia, partiu descanso merecido!
— E que ninguém me chame de tia por pelo menos duas semanas! — respondeu a outra, rindo.
Naquele momento, confesso que senti um misto de felicidade e de frustração. Felicidade por vê-lá satisfeita por encerrar mais um semestre e por saber que teriam esse tempo de pausa. Mas também triste porque na escola onde trabalho, como professor, o recesso não será exatamente um descanso, pois teremos colônia de férias durante todos os dias. É importante deixar claro que não se trata de não gostar das crianças, mas entender que professores não são incansáveis.
Com um tempo os pais, mães, avós e outros responsáveis começaram a chegar, esses estavam com semblante tenso. Fomos acolhidos pela equipe escolar que nos conduziu ao espaço onde a reunião aconteceria.
A diretora logo iniciou a fala e agradeceu a presença de todos. Durante a reunião, um tema ganhou força e causou certo incômodo entre alguns responsáveis, que seria a respeito das férias escolares. Muitos ficaram inconformados com o fato da escola entrar em recesso e não oferecer uma colônia de férias ou atividades nesse período para as crianças. O argumento utilizado foi que prejudicaria, especialmente os que trabalhavam o dia inteiro e não teriam com quem deixar seus filhos.
Enquanto ouvia as falas, confesso que me senti dividido. Como tio, compreendia a dificuldade de muitos responsáveis em conciliar as férias das crianças e o trabalho, de fato não é fácil. Mas, como pedagogo fiquei refletindo sobre o papel da escola, direitos dos professores e até mesmo das próprias crianças.
Assim como os outros trabalhos, os professores e demais funcionários também têm direito a descansar, a pausa e a renovação. As crianças também necessitam desse tempo longe das obrigações escolares, para brincar livremente, conviver com a família, viajar ou só descansar mesmo.
Naquele momento, resolvi me posicionar. Pedi a palavra e compartilhei uma reflexão. Disse que entendo a preocupação das famílias, principalmente de quem não tem com quem deixar os filhos durante o recesso. Mas que também precisamos refletir sobre a função social da escola. A escola não é, e não deveria ser um lugar apenas para deixar as crianças. Ela é um espaço de aprendizagem e desenvolvimento integral. Quando a vemos apenas como depósito ou solução para a ausência de políticas públicas de apoio às famílias, estamos distorcendo sua função.
Além disso, falei sobre os limites que devem existir entre a escola e as demais instituições sociais. Que o papel do Estado é oferecer esses espaços e políticas que acolham crianças quando a escola está em recesso. E que os professores também são trabalhadores, com direito e negar esse direito a eles é por fim comprometer o próprio processo educativo.
Alguns responsáveis concordaram, outros ficaram em silêncio. Mas senti que a fala gerou um certo impacto, pelo menos um desconforto reflexivo. A sociedade, ainda precisa aprender a valorizar a escola como espaço de formação, não como um depósito de crianças.
Saí da escola naquele dia com o coração cheio de pensamentos. Parte de mim se sentia aliviado por ter conseguido expressar algo tão importante, por ter defendido o direito ao descanso de quem educa e aprende. Mas, ao mesmo tempo, carregava um certo peso, de saber que, na minha realidade como professor de escola privada, esse descanso ainda não é possível.
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