segunda-feira, 8 de abril de 2024

COISAS QUE FICARAM POR DIZER (Eduardo)

Sexta-feira, deu pra aliviar a saudade de ouvir os relatos de vocês: o timbre da voz, a ênfase em certas sílabas, o prolongamento de algumas vogais, as pausas de suspense... tudo isso contribui para que a experiência seja comunicada e que as outras pessoas também possam sentir um pouco do que cada uma de vocês sentiu.

Voltando pra casa, algumas coisas ainda ficaram reverberando dentro de mim, como se a aula ainda não tivesse acabado. Lembrei de três coisas que gostaria de ter dito, mas que, na dinâmica da conversa, acabei esquecendo.

Primeiro, sobre a avaliação na Escola da Ponte. Em vez de uma semana de provas em que todas as estudantes são testadas, cada estudante, quando se sente preparada em determinado assunto, pede à professora que avalie se ela realmente já compreendeu tal assunto. Uma avaliação que respeita o tempo de cada estudante.

Segundo, uma conversa que aconteceu na sala dos professores sobre um assunto que de vez em quando retorna: a progressão continuada dos alunos, fazendo, por exemplo, com que estudantes cheguem ao 3º e até ao 5º ano sem saber ler. O que me fez voltar à Escola da Ponte, onde não há divisão por anos, mas por pequenos grupos móveis, com crianças de diferentes idades, que são avaliadas a cada 15 dias.

Faço essas referências à Escola da Ponte não no sentido de imitação de uma escola idealizada mas pra gente perceber como certos problemas "insolúveis" em nossa escola tradicional podem encontrar solução desde que a gente pense em mudanças um tanto mais amplas e básicas.

E a última coisa que ficou por dizer aconteceu também na sala das professoras, logo depois dos recreios. Uma das profissionais responsáveis por acompanhar crianças com necessidades especiais estava visivelmente abalada e um dos professores pediu que ela se sentasse. Ela então desabafou a respeito do trabalho exaustivo, chegando a ser batida por uma das crianças, e contando com pouco apoio dos pais que "não dão limite" para a criança. Foi um momento dolorido e, ao mesmo tempo, bonito, por ver o acolhimento dessa pessoa pelas professoras.

Lembrei de um dos desenhos produzidos por nós na atividade de acolhida feita por Cibele e Yasmim: uma boca em fogo precisando botar para fora o que estava sentindo/pensando. É muito importante que a gente tenha tempo e espaço para desabafar. A existência desse tempo-espaço alivia a pressão e diminui a possibilidade da gente "descontar" esses nossos sentimentos em situações que não são apropriadas. Há muitos e muitos anos, tive uma ideia ainda não realizada que continua comigo: à semelhança dos Alcoólicos Anônimos, criar uma espécie de Professores Anônimos, um grupo de apoio mútuo em que professoras pudessem compartilhar seus sentimentos e experiências. Será que o que estamos fazendo, nas sextas-feiras, é um pouco isso?

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