domingo, 6 de dezembro de 2020

A perspectiva di aluni

 Como professor, procuro manter viva a perspectiva di aluni. Uma forma disso, claro, é ouvindo is alunis. Outra maneira, menos óbvia, é mantendo-me como um aluno.

Depois que me tornei professor, há quase trinta anos, já fiz mestrado, doutorado, especialização, uma segunda licenciatura, outra especialização e uma série de cursos de menor duração. Esses dias mesmo estou fazendo um curso bem curto, de apenas nove encontros, para melhorar minha escrita.

Embora seja um curso online, com aulas pré-gravadas, existe um incentivo para tirar dúvidas diretamente com o professor. Me deu vontade de fazer uma pergunta e tentei escrever. Digo tentei não apenas porque o curso é em inglês e eu precisaria escrever nessa língua, mas principalmente porque a escrita se tornou um ponto vulnerável e fazer a pergunta não seria fácil. Não era uma questão técnica, mas emocional: como voltar a escrever? Como desbloquear o desejo que já foi tão natural e prazeroso, e hoje é sofrido?

Minha pergunta ficou assim:  "I once wanted to be a professional writer and had a few children's books published by local publishing houses. I also had some works selected in contests. But, after a few years of trying, I failed to make a living out of that and had to seek more steady jobs to pay the bills. So I became resentful about not being a professional writer and stopped writing overall. I regret stopping writing just because I wasn't able to make a living as a writer, but four or five years later, I still can't write anything but academic papers or class resources for my students. Sometimes, it's difficult even to read or watch writing advice like yours because they remind me of this failure. I know I'm not asking a technical question on writing, but maybe your point of view on this could help me to think about it from a new perspective."

Só ao começar a escrever mentalmente este diário, percebi que desde que enviei a pergunta ao professor não voltei ao site do curso. Eu, que acessava diariamente, tinha ficado dois dias sem entrar na plataforma. 

O que estou sentindo neste momento? 

— Medo da resposta.

Estou na dúvida se acesso o curso agora...

Vou lá...

Espere aí...

Essa foi a resposta do professor: "I hear you, Eduardo. It might encourage you to know that less than one-tenth of one percent of all writers actually make a living at it. Keep a job with a steady income and write because you love to. I had a full time job until I had written my 90th book and was in my forties. If you get lucky and break through with a bestseller, who knows? But if you don't, you'll still be doing what you love."

Senti alívio. Sinto que posso continuar a escrever em paz. 

É isso que chamo de conservar viva a perspectiva di aluni mantendo-me como um aluno. Não perder de vista que coisas que para um professor podem parecer simples, como fazer uma pergunta, na perspectiva di aluni podem carregar fortes emoções. Ser professor não é fácil. Ser aluni, muito menos. Manter a perspectiva di aluni faz florescer a empatia.

O que mais me aliviou na resposta do professor foi o início: I hear you, eu escuto você. Também me sinto escutando você, aluni, leitori, ao ler sua perspectiva nos comentários. Você é sempre muito bem-vindi.

8 comentários:

  1. Oi Professor.
    Sim estamos vivendo realidade paradoxas. Eu e você. De um lado vc é meu colega de grupo de estudos. Alguém que ganhou de cara minha admiração e respeito. De outro meu professor de uma disciplina que considero importantissima na minha jornada acadêmica. Te escolhi por as qualidades já conhecidas do colega de grupo e porque amei seu Sportfy rss O Vozes da Didática. Daí no dia que conheci esse seu meio de comunicação que dá vozes a todos, eu disse para mim mesma, quem me dera que ele fosse meu professor. Então, sinal de que as palavras têm poder. Eis me aqui para aprender de ti aquilo que preciso para segui na jornada da graduação. Congratulações!

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  2. Sim, Sol, palavras têm algum poder. Vamos continuar usando-as para o bem. Seja bem-vinda. :)

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  3. Obrigada professor por partilhar um momento tão revelador de sua personalidade. Eu também um dia me vi escritora, mas adormeci meus dores.

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    1. Grato também, Áurea. Se eu não tivesse revelado, teria ficado sem a sua revelação. :)

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  4. Acho que todo mundo um dia já pensou em escrever algo. É dar a cara à tapa, nem todo mundo quer apanhar. Eu leio cada coisa q quando termino penso: eu faria melhor. Gente que vem na onda alheia, gente que tem a fórmula ou q copia dos outros... nessas horas a única que faz sentido pra mim é a Clarice, que num dos seus livros diz, basicamente: tô nem vendo pro que tu vai interpretar, essa aqui não sou eu mermo, tu que lute p entender o que eu escrevo". Acho q é por isso que os pseudo-cult ovacionam tanto ela.

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  5. Amo escrever mas, paradoxalmente, tenho um bloqueio enorme. Surgem tantas ideias, no entanto, quando tento repassar para o papel parece que elas se atropelam e desisto...

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    1. É bem chato, Bárbara. Podem existir vários motivos para isso. Talvez você possa aplicar a pergunta que sempre faço, "o que estou sentindo neste momento?", para descobrir o que está acontecendo. Tente escrever e fique atenta a tudo que você sente até desistir. Esses sentimentos podem lhe dar uma pista do porquê deste bloqueio. :)

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